Investigadora guineense
pede nova reflexão sobre
liberdade e
independência após 50
anos

11.08.2025 -
A poeta e investigadora
guineense Odete Semedo
defendeu hoje que, 50
anos após a
independência dos países
lusófonos, é urgente
repensar a liberdade,
denunciar injustiças,
alertando que o
colonialismo "não
desapareceu,
reinventou-se" e exige
novas lutas e
protagonistas.
"Meio século depois,
somos obrigados a
interrogar o que fizemos
desse compromisso, o que
foi feito da esperança
revolucionária que
animava os rostos dos
combatentes, das
mulheres, dos jovens,
dos trabalhadores",
afirmou. Odete Semedo
intervinha num colóquio
dedicado à reflexão
sobre os 50 anos das
independências dos
países lusófonos, que
decorre entre hoje e
sexta-feira.
A investigadora lembrou
que a liberdade
conquistada com a
independência continua a
ser limitada por
injustiças estruturais:
"a terra continua mal
repartida, a juventude
parte por falta de
oportunidades, levando à
emigração e ao êxodo
rural, e a dignidade é
privilégio de poucos".
Ex-ministra da Educação
(1997 e 1999) e da Saúde
(2004 e 2005) da
Guiné-Bissau, Odete
Semedo recordou que
muitos destes países
enfrentaram
instabilidade política e
económica após a
independência.
Defendeu que, atualmente,
"ser livre é ter
soberania alimentar,
cuidar do ambiente,
controlar os recursos,
educar os filhos também
nas nossas línguas e
cuidar da terra segundo
os nossos saberes".Para
a investigadora,
reafirmar o compromisso
com a independência
significa entender que a
liberdade "não é só a
ausência do colonizador
opressor branco
ocidental, mas é
sobretudo a presença da
justiça e da inclusão"."
A independência, 50 anos
depois, exige novas
lutas e novos
protagonistas: a
juventude", afirmou,
sublinhando que os
jovens africanos "não
são apenas herdeiros da
história, mas sim
autores do futuro".
A luta, acrescentou, não
terminou com os hinos ou
as constituições,
"apenas mudou de forma,
porque o colonialismo
mudou de roupagem e de
faces."Hoje, as formas
de dominação se
sofisticaram. O
colonialismo não
desapareceu,
reinventou-se", apontou.
Entre os novos
mecanismos de dominação,
apontou a dívida externa
controlada por
instituições como o
Fundo Monetário
Internacional (FMI) e o
Banco Mundial, o
extrativismo predatório
de empresas
multinacionais, a
dependência tecnológica
e a submissão cultural.
Também participante no
colóquio, a jurista e
política luso-angolana
Francisca Van Dunem
considerou que a
independência política
foi "um passo
historicamente
indispensável" para
garantir a
autodeterminação e a
soberania dos povos."
O autogoverno, a
autodeterminação, a
independência são
exigências conaturais a
todos os indivíduos e
povos", afirmou. Para os
angolanos, acrescentou,
é essencial "reconciliar
esse passado com o
compromisso de
realizações positivas no
presente e no futuro".
Van Dunem, que ocupou em
Portugal as pastas
ministeriais da Justiça
e, interinamente, a da
Administração Interna,
apontou ainda que
refletir sobre o passado
deve servir para evitar
repetir erros: "Deve
apenas ilustrar-nos
sobre aquilo que não
queremos, em nenhuma
circunstância, ver
repetido", acrescentou.
O colóquio é promovido
pelo Centro de Estudos
Sociais (CES) da
Universidade de Coimbra,
com o apoio da Fundação
Calouste Gulbenkian e
decorre no Centro
Científico e Cultural de
Macau.
O objetivo é reunir
vozes de diferentes
países para discutir o
legado das
independências e os
desafios atuais. As
independências da
Guiné-Bissau,
Moçambique, Cabo Verde,
São Tomé e Príncipe,
Angola e Timor-Leste
aconteceram entre 1973 e
2002, na sequência das
lutas de libertação
nacional contra o
domínio colonial
português.
Cinquenta anos depois, o
colóquio propõe um
balanço dessas
conquistas e obstáculos,
refletindo também sobre
o papel dos movimentos
nacionalistas na
articulação das
aspirações dos seus
povos, no contexto das
lutas emancipadoras em
África e na Ásia.
Entre os participantes
estão também o escritor
moçambicano Luís
Bernardo Honwana e a
diplomata timorense
Pascoela Barreto. A
primeira sessão foi
dedicada às memórias e
compromissos das
independências, reunindo
testemunhos de figuras
que viveram diretamente
o processo de transição.
Durante a tarde, o
debate centra-se na
continuidade das lutas
de libertação no Sul
Global, com destaque
para o apoio de Angola e
Moçambique à
independência do
Zimbabué, Namíbia e
África do Sul, além da
solidariedade com outras
lutas anticoloniais,
como a de Timor-Leste. O
segundo e último dia do
colóquio será dedicado à
reflexão sobre legados,
heranças e políticas
transformadoras para o
futuro.
