25.05.2021 - O
Secretário-geral da
UCCLA, Vitor Ramalho,
elaborou um texto em
alusão à referida data
sobre o tema:
Evocar em 25 de Maio o
Dia de África -
No dia 25 de maio de
1963, em Adis Abeba, foi
constituída a OUA -
Organização da Unidade
Africana.
Nessa altura o mundo
encontrava-se dividido
em dois blocos, o dos
Estados Unidos da
América (EUA) e o da
ex-URSS (União das
Repúblicas Socialistas
Soviéticas). Logo nos
debates da fundação da
OUA, o posicionamento
dos países então
representados no ato
constitutivo fizeram
refletir as diferenças a
seguir no rumo da marcha
do continente africano.
De tal sorte assim foi
que, infelizmente, a
guerra fria que se
desenrolava na Europa
deu lugar, em África, a
guerras quentes por
interpostos agentes que
tinham como pano de
fundo o mundo bipolar.
Naturalmente que as
questões concretas com
que se debatia o
continente africano
nessa altura, o
apartheid, praticado
pelo regime da África do
Sul, as descolonizações
que importava
prosseguirem e a defesa
da unidade do continente
não deixaram de estar
presentes. Porém, a OUA
foi incapaz - há que
reconhecê-lo - de
ultrapassar as profundas
divergências causadas
pelo mundo bipolar,
cujos interesses
acabaram por a
influenciar e, em muitos
casos, de forma trágica.
Esta realidade, de par
com os demais
condicionalismos
existentes, conduziram
os países
recém-independentes a
serem vítimas do próprio
círculo vicioso da
pobreza, por ausência de
uma aposta num
desenvolvimento
económico coerente,
agravando o
autoritarismo do
exercício do poder
político, senão mesmo o
nepotismo, a corrupção,
a ausência de uma
planificação familiar e
o exacerbamento de
conflitos entre
religiões ecuménicas.
Sendo certo que não se
pergunta a um escravo
que deseja a liberdade
como a prioridade
essencial da sua vida, o
que espera conquistar
após alcançar essa
liberdade, também os
ex-combatentes africanos
que combateram pela
libertação dos
territórios colonizados
tinham como objetivo
serem cidadãos livres na
autogestão dos
territórios de que eram
originários.
No mais, o caminho a
seguir far-se-ia
caminhado. Isto não
significa que se
branqueie ou procure
branquear as posições
que, após as
independências, muitos
dos combatentes contra o
colonialismo e mais
tarde líderes dos
respetivos países
assumiram no exercício
do poder. Sobretudo no
alinhamento e na
dependência de um ou
outro dos blocos
existentes sem
contribuírem para a
gestação de uma linha
identitária própria para
África e nela para os
respetivos países. Para
além disso, a realidade
de hoje, sendo o que é,
faz evidenciar que o
desmantelamento do
apartheid na África do
Sul, a independência da
Namíbia (ex sudoeste
africano) e as
independências das
ex-colónias portuguesas
em África só ocorreram
após a queda do mundo
bipolar, com a implosão
da ex-URSS.
O surgimento de um mundo
que passou a ser
unipolar, polarizado nos
EUA, fez despoletar o
termo de muitos
conflitos em África que
tinham antes como pano
de fundo a realidade
bipolar, conduzindo
ainda a eleições
democráticas com base no
princípio de que a cada
cidadão deve
corresponder um voto.
Há que, porém, fazer
notar que as eleições
democráticas em África
estiveram longe de
conduzirem à
estabilização política
dos países, como a
realidade veio a
evidenciar. Isto porque
não se teve em atenção
que a realidade
diferenciada dos países
não deveria, nem
poderia, impor a
transposição mecanicista
da democracia, sem
consideração pela
especificidade concreta
dos destinatários dela,
criando molas
amortecedoras, como
Mandela concebeu para a
constituição da nova
África do Sul. Durante
esse período, a OUA
alterou a sua
denominação para UA -
União Africana.
O mundo unipolar,
hegemonizado pelos EUA
após a bipolaridade,
também já não existe
mais. Hoje temos um
mundo multipolar, tendo
surgido novas potências
à escala global - como é
sabido - e, desde logo,
a República Popular da
China.
No Dia de África, 25 de
maio de 2021, que hoje
se comemora, é com este
novo mundo que o
continente deve e tem de
olhar o futuro. Ao
fazê-lo, não é possível
deixar de considerar que
o peso do endividamento
global, muito
significativo, impõe
negociações diferentes
das que, até ao
presente, foram
encaradas para que seja
possível fazer canalizar
investimentos que
resultem da libertação
de compromissos com
moratórias a acordar, o
que vai no interesse dos
próprios credores.
De par deste objetivo,
há que fazer convergir
esforços para a
superação de tensões e
conflitos, alguns dos
quais se sustentam em
radicalismos extremos,
com alegadas raízes
messiânicas que nada têm
de fundamentos
religiosos, como o que
ocorreu no norte de
Moçambique, em Cabo
Delgado, fez evidenciar.
O combate às fortes
desigualdades que se
agravaram com a pandemia
da Covid-19, encontra
terreno fértil para os
extremismos e o
consequente combate à
corrupção não pode
deixar de estar na ordem
do dia, tal não pode
deixar de o estar a
planificação familiar,
sabendo-se como se sabe,
que as mulheres em
África têm uma
fertilidade de 5 a 7
filhos.
Daí que o continente
africano seja muito
jovem, com alguns países
a terem uma média etária
maioritária inferior a
18 anos. A conciliação
da necessidade dos
jovens terem uma
formação escolar que os
capacite para o futuro,
é, obviamente,
incompatível com a
ocupação deles em
funções produtivas.
O equilíbrio desta
resposta não é fácil,
mas não pode deixar de
ser colocado. Está em
causa o futuro que, em
África, assenta também e
sobretudo na priorização
da sustentação dos
países com a valorização
do setor primário, ou
seja, a agricultura e as
pescas.
No mais há sempre que
relevar a prevalência do
interesse geral sobre os
interesses egoístas.
Estas são hoje, entre
muitas outras, as
questões que no Dia de
África que hoje se
comemora, por ter sido
nela que foi criada a
OUA que importa a nosso
ver atender.
Infelizmente, a
persistência da pandemia
impossibilitou a
realização de uma
iniciativa presencial
evocativa da data, o que
não prejudica que a
UCCLA deixe de assinalar
este dia, com os olhos
sempre postos no futuro
de África e dos países
africanos e, desde logo,
nos de língua oficial
portuguesa.
As medidas de
desconfinamento que se
começaram a tomar, na
sequência da vacinação
generalizada, vão
seguramente possibilitar
iniciativas presenciais
que representam o pulsar
da energia de África e
dos africanos, com
debates alargados e
meritórios que reforcem
uma maior esperança de
desenvolvimento humano
para todos.
Vítor Ramalho
(Secretário-geral da
UCCLA).
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